Ben Thomas, diretor da escola Thomas’s London Day, em Londres, causou polêmica entre pais de alunos no início do mês ao afirmar que crianças não deveriam ter melhores amigos. Segundo ele, “é possível desenvolver amizades muito possessivas, e é muito mais fácil se as crianças puderem dividir os amigos e ter vários bons companheiros em vez de criar uma obsessão em torno do melhor amigo”. Ben também disse que gostaria de transformar sua ideia em política escolar, incentivando crianças de 4 a 10 anos a não se apegarem demais a um colega de classe.
À primeira vista, os argumentos do diretor até parecem fazer sentido, mas será que isso funciona na prática? De acordo com a psicóloga Rita Calegari, do Hospital São Camilo (SP), provavelmente não. “Os pais não podem efetivamente impedir que os filhos desenvolvam esses laços especiais. O melhor amigo não é uma opção, é um comportamento natural do desenvolvimento da criança”, diz a especialista.Se o seu filho tem um melhor amigo, você deve encarar isso como um sinal positivo e estimular o estreitamento desses laços. Isso porque significa que ele está criando vínculos saudáveis e, melhor ainda, com pessoas que estão fora de seu círculo familiar. Segundo Rita, no caso de crianças pequenas, o melhor amigo não necessariamente é uma pessoa – pode ser um brinquedo! “É o apego a algo que está fora de você e que sai do ambiente privado da família. O melhor amigo pode ser o primeiro passo que a criança dá no sentido do outro, de buscar o mundo”, explica a psicóloga.
Ao falar sobre o problema que amizades muito próximas trazem, Ben comentou que “amizades obsessivas” também podem machucar uma terceira criança, que fica fora daquele círculo, e que esse ostracismo seria tão doloroso quanto bullying. Mas, para Rita, mais uma vez, é o tipo de situação que os pais e educadores não podem – nem devem – excluir da vida dos filhos ou alunos. “Isso é a vida como ela é. Às vezes você quer ser melhor amigo de alguém e não consegue, porque o melhor amigo não se adquire, se conquista, e às vezes por mais esforço que você faça isso não acontece. Aí vem a frustração, baixa auto estima, coisas difíceis de lidar, mas a criança precisa entender que o mundo é assim mesmo. E quanto mais cedo ela aprende que aquilo não mata, melhor”.
Essas frustrações também podem aparecer mesmo entre os melhores amigos. Afinal, nem as relações infantis são feitas só de coisas boas. As crianças podem brigar, sentir ciúmes uma da outra ou até mesmo sofrer uma separação dolorosa porque uma delas muda de cidade. E ambas terão que aprender a lidar com esses sentimentos.
No meio de tantas emoções, o papel da família, principalmente dos pais, é dar o apoio emocional para a criança. Se algo ruim acontecer, seja porque a criança foi magoada por seu melhor amigo ou porque ela foi excluída do grupo de melhores amigos no qual gostaria de estar, os familiares precisam saber o que está acontecendo. A partir daí, devem explicar que durante a vida será normal passar por situações como essa. O mais importante é não apontar um culpado e incentivar a criança a perdoar. Se os próprios pais não souberem como agir, não precisam esconder sua fraqueza. Algo como “a mamãe também não sabe como diminuir a sua dor, mas nós vamos passar por esse momento juntos e descobrir como resolver esse problema” com certeza já fará seu filho se sentir melhor. Lembre-se: mentir, nunca! Por exemplo, se o amigo do seu filho está indo para outra cidade, não alimente suas esperanças de que ele voltará em breve, mas vocês podem combinar de visitá-lo.
Outro cuidado que os pais devem ter quando se trata do melhor amigo é não alimentar apenas essa relação. Se a criança têm suas preferências, ótimo, mas os pais não precisam incentivar a exclusividade. Até porque essa preferência provavelmente vai mudar conforme a criança cresce. Nesse sentido, vale adaptar o conselho do diretor Ben Thomas: você pode ter um melhor amigo, desde que não esqueça dos outros bons amigos. E você, se lembra do melhor amigo da sua infância?
Fonte: Revista Crescer
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